Pessah Dalva Agne Lynch Perguntaram-me o que é Pessah, ou Passover, a Páscoa judaica, e resolvi colocar a resposta para todos. A Midi de fundo é Manistanah – que representa a própria essência da Pessah: “Por que esta noite é diferente de todas as outras noites?” A Festa de Pessah (Passover, a Páscoa hebraica) dura uma semana. Ela começa em algum dia do mês de abril, ou, segundo o calendário judaico, no dia 15 do mês de Nissan. O Seder, banquete de Pessah, acontece hoje, ao cair do Sol, quando a Mãe, cabeça coberta por um véu, acende as velas. Esta é a comemoração da fuga de Israel do Egito, guiada por Moisés. A comemoração mesmo, o Seder, é muito linda, e dura no mínimo três horas, mas o normal é sete. É a única celebração que segue um ritual bem rígido, e dele participam todos os membros da família, amigos, etc. O livro do ritual se chama Hagadah, e desde a posição da comida na mesa, o tipo de comida, e a fala de cada pessoa, está descrita ali. Conta-se toda a história da saída do povo, as pragas do Egito, etc. As músicas de Pessah são muito bonitas – e a celebração toda é voltada para as crianças. Tudo é muito simplesmente explicado, com linguagem infantil. Na semana anterior, a família inteira limpa a casa toda, retirando dela tudo o que contém fermento, tudo o que nao é kosher. Tudo é armazenado em outro local. Durante a semana toda, nada que contenha fermento entrará na casa, porque Israel teve que fugir às pressas, e seu pão nao teve tempo de fermentar – e por 40 anos comeram pão sem fermento. Na tarde antes da Pessah, a criançada, a mãe e o pai percorrem a cada inteira com uma colher e uma pena de pássaro, colhendo todas as migalhas de comida fermentada que encontrarem – chametz (a mãe deixa umas migalhas de pão nos cantos da casa para isto). Daí, cantando e rindo, eles todos se dirigem ao pátio, onde acendem um fogo e queimam o chametz. No banquete, o homem mais velho da casa, o patriarca, preside. Ao seu lado senta-se a mulher mais velha da casa, e, se ela nao é sua esposa, esta senta-se do outro lado. As duas o ajudarão a presidir a cerimônia. Todos os homens têm a cabeça coberta por um kippah, chapeuzinho que cobre a cabeça. As mulheres usam véu. Todos vestem-se com suas roupas mais bonitas. A mesa é coberta de branco, assim como todos os guardanapos que cobrem a comida. Os castiçais, a baixela, os pratos de servir, as bandejas – são todos de prata, representando a prata que os egípcios deram a eles quando eles partiram. Tudo isto, e mais os pratos de comer, são guardados o ano inteiro, e usados durante somente esta semana. As taças devem conter exatamente 86 ml, já que 86 é o valor guemátrico da palavra Kos – copo. Os nossos, aqui em casa, são lindas taças de cristal trazidas da Alemanha, antes de Hitler, e que me foram dadas de presente por uma grande amiga, cuja família inteira morreu no Shoah (Holocausto). Ela entao “adotou” minha pequena família como sua. Nossa taça de Seder, amassada, veio também de lá. Estivera enterrado durante todo o tempo em que a família de minha amiga esteve nos campos de concentração. Quando todos morreram, e ela, que havia sido escondida em Portugal, voltou, e os desenterrou, juntamente com os castiçais de Seder, e os trouxe. Há também na mesa um guardanapo com um bolso, onde se guarda a metade de uma matzah – o pão sem levedo. Esta metade – aficoman – será escondida pelo homem que preside, e, no fim do banquete, a criançada precisa encontrar essa matzah. Antes disto, essa matzah estava no meio de outras duas, Quem encontra, ganha uma moeda. No banquete, comem-se ervas amargas – Maror, para lembrar a amargura do deserto. E ovo – Betsah, que representa o sacrifício e o renascer de Israel (daí o ovo de páscoa). Come-se salsa – Karpas, representando a fartura da Terra Prometida. Come-se uma mistura de nozes vinho, canela e maçã (era para ser tâmaras… rs) – Charosset, que representa o barro com o qual os escravos israelitas faziam tijolos. Há também um recipiente com água salgada, nao só representando o mar, mas também para mergulhar o Maror. E também há um osso de cordeiro no centro do prato do Seder- Zeroah, que representa o cordeiro sacrificado, cujo sangue foi colocado na soleira da porta, para que o Anjo da Morte nao entre naquela casa, quando passar para matar os primogênitos do Egito. Na outra cabeceira da mesa, há uma cadeira especial, vazia. À frente dela, o mais rico serviço de mesa da casa. Durante toda a cerimônia, a cadeira estará vazia. A cerimônia em si começa com a mulher mais velha acendendo as velas, anunciando a chegada de Pessah. Daí o patriarca diz o Kiddush -a bênção sobre o vinho. Cada pessoa beberá quatro copos de vinho durante a celebração, cada um correspondendo a uma das promessas do Eterno para seu povo. E a pessoa se reclina para a esquerda, simbolizando o descanso do povo depois da fuga do Egito. Mas a festa começa mesmo quando a criança mais jovem se aproxima do patriarca, e pergunta: Por que esta noite é diferente de todas as outras noites? E ele responde: Porque nesta noite, criança, o Anjo da Morte passou sobre nós, mas o Sangue do Cordeiro nos protegeu (passou sobre nós: pass over, daí o Passover, que veio até nós). A criança entao fará três perguntas. A primeira pergunta: por que todas as noites mergulhamos as ervas apenas uma vez, mas hoje mergulhamos duas vezes em água salgada? A segunda pergunta: por que todas as noites comemos pão, mas hoje apenas Matzah? E a terceira pergunta: por que comemos sentados todas as noites, mas hoje nos reclinamos em almofadas? Ao responder estas perguntas, o homem conta toda a história de Israel. Então a mãe pergunta a outra criança: Fulana, vai ver se Elias já chegou! A criança vai até à porta, carregando um castiçal de prata com uma vela acesa. Abre a porta, olha dos dois lados, e grita: não há ninguém aqui! E volta à mesa. Daí come-se o banquete: gafilte fish, batatas, carne de cordeiro, beterrabas (para lembrar as sopas de beterraba dos ghettos – tradição ashkenazzi), e muitas outras coisas. O prato da Cadeira de Elias recebe os melhores bocados. Daí a mãe chama outra das crianças, e lhe diz: Fulano, leva o prato para Elias! E a criança sai, carregando o prato, abre a porta, e o coloca do lado de fora. Esta comida talvez seja levada por algum mendigo, ou por algum animal. Nao importa – foi dado a Elias (nota: este costume é sephardic, nao ashkenazzi. Eu o adicionei à minha celebração por amor a uma amiga Sephardic que sempre comemorou o Seder conosco). Depois da refeição, as crianças repetem em coro dez versos sobre a Pessah, e cantam a canção do Cordeirinho (Haggadiah). Daí todos se sentam, e cantam canções antigas (zigunim) juntos, os homens e meninos se movimentando suavemente para frente e para trás. Daí todos se levantam, ajudam a limpar a mesa, e vão dormir. No dia seguinte a festa continua. |
Dalva Agne Lynch |
foto: meu filho Joseph lendo a Hagadah, durante o Seder de Pessah – 1998
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Publicado em 18/04/2008 às 20h02
Música: Manistanah – dominio publico
1 Comentário para “PESSAH – por Dalva Agne Lynch (Outros Autores)”
Já conhecia algumas nuances dessa história , mas o texto é bem esclarecedor e detalhado conta a bela história da páscoa judaica. Valeu muito !