1º de maio – DIA DA LITERATURA BRASILEIRA – em homenagem ao escritor JOSÉ DE ALENCAR, nascido em 1º de maio de 1829.
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Alencar… Modernista?
O presente título é uma provocação, ou melhor, uma espécie de assalto à atenção dos que leem estas primeiras linhas. A intenção não é outra senão esta: Analisar se a proposição de que José de Alencar, ícone do Romantismo brasileiro, como pioneiro do Modernismo no País faz sentido para a crítica. É uma discussão “sem pé nem cabeça”, eu bem sei, mas se faz necessária no momento, afinal, é o que se tem lido, nos últimos tempos, espalhado em livrinhos de “resumo de obras” do vestibular, muito comuns nos finais de ano. Não bastasse o prejuízo cultural e editorial que tais “resumos” apelativos provocam, nossos estudantes agora consomem dados inverídicos e sem qualquer responsabilidade, perturbando, assim, um juízo correto da Literatura Brasileira.
Esta questão, permitam-me a pequena intervenção, vem de longos carnavais e não é coisa de outro mundo, há uma corrente de professores que agora se dizem críticos a difundir essa proposta sem sentido nas cidades brasileiras, e talvez a celeuma perdure por longas datas enquanto a crítica continuar sendo tão incompreendida, mal interpretada e negligenciada dessa maneira.
A falta de apuração ou, talvez, a impropriedade quanto ao assunto tenha sequer sugerido esta questão àquele que resenhou tal postulado. Por certo, Alencar inovou sim, aproveitando a onda nativista brasileira iniciada pelo poeta Gonçalves Dias (com seus famosos poemas de cunho indianista), todavia, a incorporação da temática indígena ao romance brasileiro não simboliza, por si, uma tomada legítima do Modernismo em nossa literatura. Na verdade, nascia, ali, as primeiras investidas à procura da identidade nacional, identidade esta que enxergou no índio o caminho mais certo para explorar a originalidade e origem da nação. Neste sentido, Alencar foi, talvez, a estrela mais brilhante no quesito prosa indianista brasileira: Seus três livros se tornaram clássicos (Iracema, O Guarani e Ubirajara); e representam duas fases importantes na formação do Brasil: O período pré-cabralino com Ubirajara (1874), ausente de elementos europeus, embora munido de sensações, pensamentos, descrições do cenário e das relações com olhar “civilizado”; além de Iracema (1857) e O Guarani (1865), que são narrações situadas em um tempo de exploração das terras brasileiras por parte dos europeus em consonância com a montagem mítica das primeiras “misturas étnicas”, se é que posso me apropriar deste termo, entre brancos e índios. No caso de Iracema, ainda se observa outra particularidade: O branco abstrai-se de sua realidade e se incorpora ao meio indígena; e em O Guarani, o inverso, o índio insere-se no meio “civilizado”, europeu, português…
Mas isso não gabarita em nada classificar Alencar como precursor do Modernismo brasileiro, é trocar “alhos por bugalhos”, modernidade por Modernismo; como bem cita Zilá Bernd no livro “Literatura e Identidade Nacional” (1992): “[...] a obra de Alencar se constitui com um alto grau de fidelidade à hegemonia discursiva que se impõe na Europa desde o século XVI”; a propósito disto, se analisadas superficialmente, enxerga-se que tais tomadas indianistas alencarianas se foram tecidas pelos fios do malogro identitário: Por um lado, pregavam a busca desenfreada dos elementos nativistas, por outro, construíam personagens indígenas destoantes à própria realidade, ao modo europeu, cuja idealização forjava um sentido aristocrático de mundo. A eleição de Alencar, portanto, como precursor do movimento, que só vem a estourar na nação no ano de 1922 com a Semana da Arte Moderna, soa uma grande troça, ou, antes, contradição sem tamanho: Como podia um movimento rebelde (o Modernismo), responsável pela quebra de todo e qualquer modelo e tradição, ter sua bandeira levantada, inicialmente, por um literato e político conservador que discursava em defesa da escravidão, tradição e monarquia (“a Monarquia é não só uma instituição tradicional no Brasil como é uma instituição de raça”)?
Se a moda agora é inventar e supor absurdidades, como, também, a que Safo (Séc. VII a.C.) antecipou a poesia concisa atual, questão esta já bem difundida em São Paulo, arriscamo-nos a propor, em igual tom, que Peri, num gesto heroico, ao arrancar sozinho o tronco de uma palmeira com o auxílio apenas de seus braços, dava início, sem saber, à literatura fantástica brasileira, ou melhor, ao movimento surrealista do Brasil ou, quem sabe ainda, à literatura marginal, defendendo os interesses sociais da gente oprimida que vivia nas periferias florestais indígenas do Brasil Colônia. Se essa moda pega…
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Por Daniel C. B. Ciarlini
1 Comentário para “1º de maio – DIA DA LITERATURA BRASILEIRA – por Daniel Ciarlini (Outros Autores)”
Essa discussão é fascinante, pois desperta para as diferentes leituras que os estudos e críticas podem aflorar!