CÍRCULO
©Dalva Lynch
Pertenço aqui, no tosco círculo riscado na realidade do chão
Sob esparsas luzes de estrelas, de velas, de fogueiras
A luz da Lua, seu rosto iluminado e iluminante
As luzes dos olhos dos que me cercam, roupas ao vento
Refletindo estrelas como imensidão de abismos.
Com eles levanto as mãos ao orvalho, ao sereno, à chuva
Acolho o vendaval e o sol nascente com o mesmo amor
Como a mulher que sou, e que recebe de seu homem
Tanto a alegria quanto o tormento, sabendo que ambos
São parte apenas de uma realidade maior, além do homem
E que o poder do amor que nasce em mim é meu
Não dele. Penetro assim no círculo como quem chega em casa.
Como quem abre a porta para sentir um cheiro conhecido
Deixando fora o mundo da certeza dos jovens conceituosos
Dos velhos desiludidos a buscar consolo na garrafa
De mulheres cansadas que desconhecem que são belas.
Penetro no som, na dança, na bruma, no fogo, no frio
No poder da Terra, de onde saem todos os viventes
E aonde todos eles retornam – alguns assim, em canto
Outros apenas quando todas as suas realidades se apagam -
A realidade da certeza, da garrafa, da desilusão -
E a Terra afinal os recebe, última pousada, útero e cova.
Estes dormem sem que descubram a grandeza da liberdade
O poder intenso e imanente de conhecer e conhecer-se
De sentir-se filho e amante, mãe e consorte, livre e interligado.
Quanto a mim – escolho o círculo da realidade do chão
O canto do vendaval e do sol nascente
O canto da alegria e do tormento.
Eu sou semente, árvore, fruto.
Sou mulher, o tosco círculo
Riscado na realidade do chão.
*
Site oficial da autora: www.dalvalynch.net