FILOSOFIA E TEOLOGIA – por Rita de Cássia Amorim Andrade (Artigo)

Postado por Rita de Cássia ligado abr 20, 2011 em Artigos / Crônicas | 2 Comentários

FILOSOFIA e TEOLOGIA

    Por Rita de Cássia Amorim Andrade

“A ideia de Deus é parte do homem. Nasceu com ele. Ao longo dos milênios, o homem procurou na religião resposta para muitos dos enigmas do universo e para as dúvidas do seu interior. Mesmo transitando da vida das cavernas ao moderno deslumbramento científico, ele não repudiou a divindade. Ainda quando a razão tenha proposto soluções científicas e filosóficas para enigmas e dúvidas, o apelo da fé continua a ressoar nos corações, apontando para uma realidade posta além das conquistas racionais”. (Victor Civita).

No Antigo Oriente, a filosofia confundia-se com a religião. Eles possuíam verdades filosóficas e não a filosofia propriamente dita.

Com os filósofos gregos, o sentido religioso já não se faz presente na filosofia, posto que a filosofia vá confundir-se com a ciência, embora conservando o seu aspecto universal.

Na Idade Média, há um retorno da filosofia à religião, no caso, o cristianismo, quando a razão se harmoniza com a fé e a filosofia com a teologia.

Vamos encontrar na escolástica o auge dessa discussão. O ensino escolástico se baseia em textos lidos e discutidos. Dentre estes textos estão os evangelhos, obras de padres e de teólogos. Nesse contexto, sobressai Santo Tomaz de Aquino.

Muito antes, Santo Agostinho já não via muita diferença entre a natureza-objeto da filosofia e o além-natureza – objeto da teologia. Mas Santo Agostinho não confiava na natureza humana; ele achava que o homem necessitava da graça, elemento sobrenatural, para realizações puramente naturais. Ele dizia que a fé é preparada pela razão e prolongada por esta; que era “preciso crer para compreender e compreender para crer”. Santo Tomaz aperfeiçoa o pensamento Aristotélico, estabelece o verdadeiro objeto da filosofia e distingue esta da teologia, mas não as separa. Ele diz que as verdades da fé servem para iluminar os caminhos do pensar filosófico; que a própria filosofia explicaria a fé se se excedesse um pouco mais na demonstração das verdades reveladas. Faz as diferenças, quando diz que:

. o filósofo demonstra por razões evidentes.

. o teólogo apela à autoridade suprema da revelação divina.

E acrescenta que Deus é autor de nossa razão e autor da revelação:

. que a fé sabe o que sabe por aceitação referencial da autoridade divina, enquanto:

. a razão sabe o que sabe por própria atividade inteligente.

Mas não podem contradizer-se porque os princípios do raciocínio foram postos em nós por Deus, que é o mesmo autor da revelação recebida pela fé.

Na diferença por finalidade, Santo Tomé diz que a teologia nos dá acesso às verdades necessárias à salvação, que Deus não nos revelou todas as verdades possíveis sobre as coisas, daí haver a possibilidade da filosofia na investigação das coisas.

Pelos métodos, ele diz que o filósofo tira seus argumentos das essências das coisas, ou seja, de suas causas próprias e o teólogo, ao contrário, parte sempre da Primeira Causa ou de Deus.

Como se vê, Santo Tomaz, mesmo tendo feito uma distinção nítida entre filosofia e teologia, reclama a colaboração estreita entre uma e outra. No correr do sec. XIII, os chamados averroístas, latinos, que seguiam a filosofia aristotélica, exigiam uma filosofia totalmente independente da teologia rejeitado por Santo Tomaz. De certa forma, Santo Tomaz distinguiu a filosofia da teologia, mas não a separou.

Alguns autores afirmam que a Escolástica é teológica; que teologia e filosofia coexistem.

Julián Marías dá o exemplo do dogma da Eucaristia, que é algo religioso, que em si mesmo nada tem a ver com a filosofia, mas que, para compreendê-lo, podemos recorrer ao conceito de transubstanciação, que é um conceito filosófico.

Sabemos que transubstanciação é a mudança de uma substância em outra, no caso, a presença de Jesus Cristo no Sacramento da Eucaristia ou mudança do pão e do vinho, no seu corpo e no seu sangue.

Manuel Garcia Morente diz que: nas coisas humanas e mundanas, a garantia do acerto ou da verdade é exigida em forma de provas e demonstrações que nos convencem de que o pensado ou o falado coincide com o objeto a que se refere.

Mas se o objeto está fora do alcance de nossa faculdade de comprovar e demonstrar e se de outra parte a afirmação vem acompanhada de evidentes sinais que a indicam como de procedência divina, então é possível e conveniente, e necessário recebê-la por verdadeira, embora não possamos comprová-la.

Leonel Franca, em “A crise do mundo moderno” (José Olímpio, Rio, 1941, p.90-1), diz que entre a filosofia e a teologia há uma distinção de espécie. Diferem pelo conteúdo e mais ainda, pelo método de demonstração:

- A FILOSOFIA estende o seu domínio sobre a universalidade das coisas naturais submetidas ao nosso conhecimento;

- A TEOLOGIA restringe-se por si ao número das verdades necessárias ou conveniente à nossa salvação

Na imensa extensão destes dois campos, delimita-se uma região ocupada simultaneamente pelas duas disciplinas:

Há teses filosóficas que se acham também incluídas no patrimônio dos dogmas revelados. Mas ainda, neste terreno comum, a heterogeneidade dos princípios demonstrativos impõe entre a filosofia e a teologia uma distinção formal, absoluta e estrita.

– O filósofo vai buscar os seus argumentos na análise racional da essência das coisas, na necessidade interna das suas causas próprias;

– O teólogo, pede-os ao princípio extrínseco de uma revelação histórica.

Enquanto a certeza da fé descansa, como em último fundamento, numa autoridade infalível, as conclusões do filósofo são o fruto de processos lógicos em que a razão manifesta integralmente todo o rigor de suas exigências.

Já no sec. XVIII, Descartes rejeita a teologia, quando diz que: na religião “o que interessa é ganhar o céu; acontece, porém, que o céu pode ser ganho sem que nada se saiba de teologia; o que evidencia a manifesta inutilidade desta”.

Descartes preparou uma cisão entre a filosofia e a teologia, tendo Guilherme de Ockham completado esta cisão, considerando a filosofia autônoma e completamente diferente da teologia. Posteriormente, alguns admitiam só a fé, separando totalmente esta de qualquer valor teórico. Outros rejeitaram radicalmente a fé, professando uma filosofia anti-religiosa, a qual se estende até os nossos dias.

Enfim, podemos concluir que a Filosofia é autônoma em relação à Teologia?

PFEIL diz que “a fonte da Filosofia são as faculdades naturais da razão, do afeto e da vontade. A fonte da teologia, pelo contrário, é a revelação e a graça de Deus”.

O fim da Filosofia é a sabedoria humana e natural (mundividência Creta, modo de viver devido, salvação e felicidade), enquanto o fim da Teologia é a aquisição da sabedoria divina ou sobrenatural (conhecimento da revelação, vida virtuosa sobrenatural, justificação e bem-aventurança.

 

No começo da idade moderna, a ciência toma vulto e a fé passa a ser considerada uma fantasia, como consideram, no nosso século, o positivismo, o pragmatismo, o materialismo, o biologismo, o ateísmo, etc.

Mas, acrescenta PFEIL, que a fé dá ao filósofo a serenidade para a reflexão filosófica, o que não acontece com o existencialismo, cuja angústia e desespero, ao tratar os problemas de mundividência, de homens sem fé, levam-nos a conclusões precipitadas e irracionais.

BOEHNER, Philotheus – GILSON, Etienne. História da Filosofia Cristã. Trad. Raimundo Vier, 2ª ed. Petrópolis, Vozes, 1982, p.570-2.

 

 

 

FILOSOFIA   X  TEOLOGIA  – distinção

 

FILOSOFIA                                                                               TEOLOGIA

Ambas são ciências de Deus

A filosofia vê as coisas                                                 A teologia vê Deus nele

nelas mesmas e Deus                                                     mesmo e as coisas em

nas coisas                                                                          Deus

 

Princípios

são vistos (evidência                                                  são criados (evidência

Intrínseca) pelo filósofo                                            extrínseca: Autoridade

                                                                                           de Deus que revela)

                                                                                           pelo teólogo

Relação

Sabedorias – filosóficas

e teológicas – têm a mesma face: Deus

 

Distinção

 

Pelo objeto formal:

é Deus como causa do ser                                  é Deus em sua deidade

 

Pela luz que conhece

a luz da filosofia é a luz                                         na teologia é uma luz mista,

natural da razão                                                      isto é, a luz da razão

                                                                                       aclamada pela luz da fé

(baseado em Orlando Vilela)

2 Comentários para “FILOSOFIA E TEOLOGIA – por Rita de Cássia Amorim Andrade (Artigo)”

  1. Modesto Lazzarin disse em:

    teologia não e um estudo! Teologia e o dão da sabedoria divina.

  2. Modesto Lazzarin disse em:

    gostei muito, pois e isso que mais me interessa pra mim
    o conhecimento da realidade.
    para mim a filosofia tem o conhecimento do visível aquilo que e palpável.
    A Teologia e o conhecimento do investível impalpável.

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