Giuseppe Verdi e Richard Wagner – duzentos anos dos “monstros sagrados” da Ópera
Josélia Costandrade – ABCA RJ – associação Brasileira de Críticos de Arte
“Va pensiero sul alli dorati”… Quando os últimos acordes do “coro dos escravos hebreus na Babilônia” – no terceiro ato da ópera “Nabucco”, de Giuseppe Verdi soaram no Teatro Scalla de Milão, o público foi ao delírio. Aquele não era o lamento de escravizados, mas um grito de guerra do povo italiano contra o domínio do Império austro – húngaro no norte do país. Nabucodonosor personificava o imperador Francisco José, da Áustria. Oportuna e revolucionária, a estréia da ópera, no dia 9 de março de 1842, foi como um rastilho de pólvora, tornou-se panfletária, originando a sigla “Viva VERDI” (Viva Victor Emanuel rei da Itália), que era escrita nos muros, usada como saudação, inflamando os sentimentos patrióticos.
Dividido em quatro atos – I: Jerusalém, II: A blasfêmia, III: A profecia, IV: O ídolo caído – “Nabucco” é monumental em sua estrutura melódica, bem característica do estilo verdiano e até mesmo profética, no desenvolvimento do relato bíblico e fato histórico, quando o significado do IV e último ato, o ídolo caído vaticina a derrocada dos Habsburgos. Na sequência, o suicido do príncipe herdeiro, Rodolfo, em Meyerling, o assassinato da imperatriz Sissi, por um anarquista, em Nice e o atentado que matou o arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa, em Sarajevo, incidente que daria início à Primeira Guerra Mundial. O ápice aconteceu no dia 3 de dezembro de 1918, com o cessar fogo e o inevitável fim do Império, transformado em República da Áustria, com 9 milhões de habitantes. “Va pensiero”…
Criador do som estereofônico, que o cinema utilizaria muitos anos depois, Verdi nasceu no dia 10 de outubro de 1813, em Ramole e faleceu em 27 de janeiro de 1901. Melodista extraordinário dominou admiravelmente o gênero melodramático, desenvolvendo temas plenos de colorido e paixão. Em I vésperi siciliani aborda a revolta dos patriotas de Palermo e Nápoles – Reino das Duas Sicílias – então sob o domínio de Napoleão Bonaparte. Vingança e morte unem-se nas tramas de Aída, Il Trovatore, Don Carlos, Rigoletto, em contraste com La Traviata, execrada inicialmente e posteriormente adotada e adorada pelo público. A sua Missa de Requiem, portadora dos recursos melódicos e harmônicos do autor, atinge os paramos da sublimidade, da divindade.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o ditador Adolf Hitler utilizou amplamente as óperas de Richard Wagner, na propaganda nacionalista e anti – semita, por um equívoco de que a glorificação dos mitos germânicos servia de base para as suas idéias idiotas. A loucura nazista não vislumbrava um átimo da grandiosidade inerente à obra e ao estilo do compositor, nascido no dia 22 de maio de 1813, em Leipzig e falecido em Veneza, no dia 13 de janeiro de 1883. As características de sentido nacionalista foram criadas pelo estilo Romântico, surgido com Schiller e Goethe e que tinha como fonte de inspiração os costumes e as tradições de cada povo, sendo seguido por artistas de vários países, inclusive no Brasil, com Castro Alves e Carlos Gomes, entre outros.
Inconfundível e avassaladora, a obra de Wagner apropria-se de aspectos metafísicos, na temática muitas vezes transcendental e permanentemente ligada aos mitos germânicos, repletos de deuses, seres elementais: gnomos, elfos, sereias, ondinas, fadas, em contraponto com lutas, querelas e sentimentos humanos, ambientados entre o Valhala e a terra. O leitmotiv é sua inovação do segmento de um tema em vários aspectos. Assim, Wagner compôs as óperas legendárias, desde a Tetralogia O anel dos nibelungos – com O ouro do Reno, A Valquíria, Lohengrin, Tanhausen” e na sequência, Sigfried, Os mestres cantores de Nurenberg, Tristão e Isolda, O navio fantasma. Surgiram os Festivais de Beuyreyt, com as montagens das óperas que sempre requereram vozes extraordinárias de cantores ditos “wagnerianos”.
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Por JOSÉLIA COSTANDRADE