AS FLORES E A HORTA
Por Afonso Lopes Vieira
Nos Direitos do Homem, quanto a mim,
faz uma falta enorme que não venha
que toda a humana criatura tenha
direito a ter um jardim!
Este jardim é apenas um cantinho,
como convém;
mas as coisas do rude jardinzinho
criam-se bem.
Temos cravos vermelhos a cantar
com rubra voz,
que perfuma, com a cor e o cheiro, o ar
em roda de nós.
Temos os girassóis, que todo o dia
olham de frente
o Sol, e ensinam, simples, a alegria,
heroicamente.
Temos as sardinheiras, — raparigas
filhas do povo,
que vão p’ra a festa com seu lenço novo
a rir cantigas!
Temos as rosas bravas, linda flor
do meu amor;
e as doces moreninhas dos poetas:
as violetas.
Entre a beleza pródiga das cores
e dos perfumes,
florescem essas outras verdes flores:
os legumes.
As couves, com o seu verde meigo e ledo,
são tão belas!
(E houve tempo em que os poetas tinham medo
de falar delas…)
Enfim, todo ele é apenas um cantinho,
como convém:
mas as coisas do rude jardinzinho
criam-se bem.
Dá-nos as flores e a horta e, ao fim do dia,
Sentimo-lo sorrir e respirar…
E a mim dá-me a ilusão dessa alegria
de lidar com a terra — e de a cavar!
*
Afonso Lopes Vieira
Canções do Vento e do Sol
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