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O PAPA FRANCISCO e o legado cultural dos Jesuítas
Josélia Costandrade – ABCA – Associação Brasileira de Críticos de Arte
Da Catedral do México, às Igrejas do “ciclo do ouro”, em Minas, à Catedral de Oeiras, no Piauí, às Igrejas de Olinda e da Bahia, os conjuntos de edifícios dos Sete povos das Missões, no Rio Grande do Sul e além do rio Uruguai – em todos os territórios da América Espanhola e nas demais colônias de Portugal e Espanha, onde a Companhia de Jesus atuou, seu legado artístico, religioso e cultural é incontestável, através do estilo Barroco, praticamente a linguagem universal, cosmopolita e doutrinária da Igreja Católica, ao longo de três séculos.
Definindo-se como o Papa “do fim do mundo”, o argentino Jorge Mário Bergoglio, o Papa Francisco, primeiro Jesuíta a ocupar o Trono de São Pedro, praticamente recupera o trabalho evangelizador e cultural empreendido por sua Congregação, de 1534 a 1773, até sua posterior restauração, em 1814,entre as Guerras napoleônicas. No Piauí e sob as ordens do marquês de Pombal, os jesuítas sediados no Brejo de Santo Inácio – cercaa de Oeiras – foram retirados “a ferro”, enquanto o povo chorava.
Coincidindo com as Grandes Descobertas e a Renascença italiana, a Reforma Protestante de Martinho Lutero golpeou fortemente a Igreja Católica, a qual reagiu com a realização do Concílio de Trento (1545-1563), que organizou os cânones da logística sgura para “recuperar os seguidores”. Uma das fórmulas foi a criação do Barroco, ou “estilo da Contra-Reforma”, com os elementos estéticos, formais e filosóficos capazes de criar uma atmosfera dogmática deslumbrante. O alvo primordial eram os habitantes das terras recém-descobertas do Novo Mundo. E para tal empresa, a Companhia de Jesus prestava-se admiravelmente. Fundada em 1534, pelo basco Inigo (Inácio) Lopez de Loyola e alguns estudantes egressos da Universidade de Paris, a Ordem dos Jesuitas recebeu a bula papal em 1540 e, já em 1549 chegava ao Brasil (Bahia) um grupo de seis padres jesuítas, chefiados por Manuel da Nóbrega. Eram sacerdotes de grande cultura, entre os mais brilhantes de toda a Europa, confrontando o desconhecido com um ideal muito acima de suas limitadas forças humanas. E ocupara intelectualmente o Brasil, evangelizando, edificando igrejas e colégios, como em São Paulo, a cidade surgida ao redor do Colégio fundado pelo padre Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, ainda um noviço. A presença do padre Antônio Vieira, teólogo célebre por seu “Discurso sem verbo” foi inestimável.
Estilo europeu altamente sofisticado, o Barroco transplantou-se às Américas de maneira original e inconfundível, mantendo um intenso colóquio com os costumes, as tradições e os materiais de cada região na qual floresceu. Os jesuítas, pedagogos revolucionários perceberam e respeitaram as habilidades dos artistas artesãos locais – índios cristianizados e que lograram contribuir admiravelmente com seu trabalho. Assim, na Nova Granada, o “estilo cuzquenho”, na Pintura, surgiu juntamente com o “plateresco”, referente às minas de prata daquela colônia. E no Brasil, enquanto as igrejas da chamada “civilização do couro”, como no Piauí, a Catedral de Oeiras, que pertence à fase angular, muito diversa das igrejas do “ciclo do ouro”, em Minas e suas elaboradas curvas e contra curvas, com uma decoração minuciosa, no interior e na parte externa.
Se o padre José de Anchieta, poeta e pedagogo, ao percorrer o Brasil teve a oportunidade de escrever o seu “Dicionário da língua geral”, também compôs seus versos sobre a areia das praias. Estou bem próxima da lagoa de Araçatiba – Maricá, cenário do lendário “milagre dos peixes” protagonizado por Anchieta e diante dos índios por ele catequizados. Os poemas que Anchieta escreveu nas areias da lagoa, levados pelo vento permanecem indelevelmente no cosmos.